Julho de 2006. Jordan Gruver, um menino de apenas 16 anos, filho de imigrantes panamenhos, passeia pela feira agropecuária de Brandenburg, no estado de Kentucky, sudoeste dos EUA. Outros 5 jovens estão no evento também. Eles distribuem cartões e panfletos de uma organização chamada Clãs Imperiais da América (Imperial Klans of America). Aparentemente, estão recrutando novos integrantes para o grupo. Dois deles, ao notar os traços indígenas na fisionomia do adolescente, começam a xingá-lo. Em seguida, partem para a agressão física. O garoto é tão surrado que acaba com algumas costelas quebradas e um antebraço fraturado, além de um traumatismo grave na mandíbula, múltiplos cortes e hematomas espalhados por todo o corpo.


O caso do menino Jordan Gruver é uma prova de que a temida Ku Klux Klan, uma sociedade secreta nascida para matar negros, no final do século 19, continua viva, perfeitamente adaptada ao mundo de hoje. Essa é a nova cara da Klan e de seus aliados. Os fascistas americanos já não usam capuz e túnica branca, salvo raras exceções. Mas ainda queimam cruzes, muitas vezes acompanhadas de uma suástica. E continuam fazendo vítimas.

De acordo com a Liga Antidifamação (Anti-Defamation League), que monitora grupos extremistas nos EUA, o ódio racial é a característica comum mais forte entre todas essas organizações. Há poucas diferenças fundamentais entre elas. Uma exceção diz respeito aos judeus: a moderna KKK quase sempre prefere não persegui-los, diferentemente do que aconteceu no passado, enquanto neonazistas continuam dispostos a exterminá-los. Ainda segundo a ADL, a maioria dos membros da Klan é cristã, enquanto os neonazis se declaram pagãos ou ateus.
Seja como for, os inimigos quase sempre são comuns, o que aproxima um grupo do outro. A boa vizinhança das últimas décadas parece ter levado a uma espécie de “nazificação” desenfreada da Klan. O fenômeno não chega a surpreender, afinal, a organização flerta com o nazismo desde os anos 30. O que surpreende é o resultado prático desse fenômeno. Os klansmen de hoje parecem punks. Basta olhar para um integrante típico da atual KKK. Ele já não quer mais saber de capuz branco. Prefere um uniforme militar, qualquer que seja sua cor.

No dia 3 de novembro de 1979, trabalhadores e militantes comunistas foram às ruas da cidade para protestar contra a KKK, forte e influente naquela região, apesar da crise que o grupo enfrentava no resto do país. De repente, 9 carros cheios de integrantes da Klan e do Partido Nazista Americano apareceram. No melhor estilo gângster, os ocupantes desceram e simplesmente abriram fogo contra os manifestantes. O episódio entrou para a história como o Massacre de Greensboro. Cinco pessoas morreram e dezenas ficaram feridas, incluindo crianças. Dos 40 klansmen e neonazistas envolvidos no atentado, 16 foram presos. Desses, apenas 6 enfrentaram um tribunal. E só 4 acabaram condenados.


O sul dos EUA estava em ruínas, resultado da derrota na Guerra Civil Americana. Humilhados, os soldados do Exército Confederado voltavam para casa doidos para descarregar suas frustrações em alguém. Encontraram nos negros o bode expiatório ideal. Financiada por fazendeiros e comerciantes que sobreviveram ao cataclismo econômico do pós-guerra, a KKK começou a crescer rápida e assustadoramente. Em 1867, já eram cerca de 500 mil. O primeiro líder supremo, ou Grande Mago, foi Nathan Bedford Forrest, ex-general confederado.
Enquanto isso, por imposição dos abolicionistas vencedores da guerra, os negros deixavam de ser escravos e ganhavam direito a voto, escola e porte de armas. Para a Klan, o ressentimento agora era duplo, suficiente para acrescentar à lista de inimigos mortais da organização os políticos que estavam por trás daquela nova ordem. Em 1868, o congressista republicano James Hinds, um dos responsáveis pelas leis que igualavam negros e brancos, foi assassinado. No ano seguinte, o júri federal dos EUA qualificou a KKK como “grupo terrorista” pela primeira vez na história, e acabou mandando centenas de klansmen para a cadeia.


Àquela altura, os inimigos da Ku Klux Klan já não eram apenas os negros. A 1ª Guerra Mundial tinha desencadeado um intenso processo de imigração da Europa para os EUA. Resultado: estrangeiros, especialmente judeus, passaram a ser perseguidos. Comunistas também eram considerados escória, assim como homossexuais, prostitutas, mães solteiras, católicos... Qualquer um que a KKK julgasse nocivo e eliminável. Os métodos do grupo continuavam os mesmos da geração anterior: espalhar o terror por meio de assassinatos, linchamentos, enforcamentos, estupros e incêndios criminosos.
Quando o chefe da Klan em Indiana, David Stephenson, foi preso por estuprar uma professora, em 1925, as investigações revelaram que a cúpula da organização estava metida em esquemas de corrupção que envolviam até o prefeito de Indianápolis e o governador do estado. A Ku Klux Klan caiu em desgraça perante a opinião pública e seus 5 milhões de adeptos despencaram para apenas 30 mil por volta de 1930. A sociedade secreta mais poderosa e sinistra dos EUA jamais seria a mesma daí em diante.



Fonte:
Sara Bullard - The Ku Klux Klan: A History of Racism and Violence
Thomas Dixon Jr. - The Clansmen
Wyn Craig Wade - The Fiery Cross