O Brasil é dos países mais desiguais do mundo. Estou cansado do diagnóstico estatístico, das análises acadêmicas e dos discursos demagógicos. Grande parcela das camadas dirigentes da sociedade não parece interessada em resolver o problema, ou seja, em trocar o egoísmo e o preconceito contra os pobres( e sua mamata), pela prosperidade nacional, pela paz, em casa e nas ruas. Não conseguimos, até hoje reconhecer a dignidade de todos os brasileiros, e promover a integração social dos marginalizados (embora, no ponto de vista do IBGE, tenhamos avançado um pouco, nos últimos decênios).
Os atuais "CAPs" da Universidade de Frankfurt propõem outra motivação para a revolução: o reconhecimento social. Enfim, trata-se da aceitação do direito de todos participarem da sociedade econômica e cultural de nosso tempo. O discurso de Axel Honneth, atual dirigente do grupo, tem o mérito de se concentrar sobre o maior problema ético da sociedade contemporânea, o do reconhecimento de qualquer ser humano como cidadão.
A tese não é nova, mas atualíssima. São Tomás de Aquino foi radical, ao afirmar que, sem o mínimo de bens materiais, os homens estão dispensados do exercício da virtude. Quem já passou fome sabe que o mais terrível dessa situação é o sentimento de raiva, de impotência, da indignidade de não conseguir prover com seus braços o alimento do próprio corpo. Quem não come, não faz parte da comunidade da vida. E ainda “há outras fomes, e outros alimentos”, como dizia Drummond.
É o que ocorre com grande parte da população brasileira, sobretudo no Rio, em São Paulo, no Recife, em Salvador, enfim em todas as grandes metrópoles. Mesmo que comam, não se sentem integrados na sociedade nacional, falta-lhes “outro alimento”. Os ricos e os integrantes da alta classe média, que os humilham, a bordo de seus automóveis e mansões, são vistos como estrangeiros, senhores de um território ocupado, território no qual as autoridades atuam como forças de repressão, e não sabem atuar de outra forma, apesar da famigerada canonização de Cabral (não o Pedro) pelas UPPs, apesar de existir meios muito mais eficazes de resolver o problema agindo de forma conjunta com a presença do estado na comunidade, e você sabe muito bem que meios são esses.
Talvez seja necessário que esperemos a chegada de um dia no qual nossos lideres ponham a mão na consciência (isso se eles tiverem alguma) e parem de usurpar o dinheiro que não lhes convém, parando de desviar a verba da saúde, da educação, do "tódinho" da creche ou que ratifiquem um salário no mínimo digno ao policial (Michele feelings), ou talvez seja menos impossível se assumirmos nossa parcela de culpa e desenvolvermos a responsabilidade para ensinar à essa geração politicamente obsoleta que o jovem pode e deve fazer política, não que ele tenha que necessariamente se candidatar ou ser partidário, mas que pense antes de votar, que aprenda a conhecer seus candidatos, a analisar, requerer, protestar e, se preciso, derrubar.
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A diferença entre o que ocorre no Rio e em Paris e Londres é que, lá, o comando das manifestações é compartido entre os estudantes, trabalhadores e setores da classe média, bem informados e instruídos. Aqui, nós só vemos os frutos do descaso como os incêndios de automóveis e os ataques à polícia que são realizados pelos marginalizados de tudo, até mesmo do respeito à vida. À própria vida e à vida dos outros.